O que será dos ‘retornados’ portugueses? Artigo no semanário se oposição ‘Opinião’ em 1977

Por Gustavo Barreto (*)
Artigo no semanário de oposição Opinião em sua edição de 14 de janeiro de 1977

Artigo no semanário de oposição Opinião em sua edição de 14 de janeiro de 1977

O semanário de oposição Opinião, tabloide lançado no Rio de Janeiro em 19721 – em pleno regime ditatorial – aborda em sua edição de 14 de janeiro de 19772 a imigração portuguesa no Brasil, no contexto da revolução de abril de 1974 em Portugal. O articulista Davide C. Mota afirma que o tema tem sido motivo de “mal-entendidos e especulações”, observando que, para muitos, o aumento de entradas de portugueses nos portos brasileiros seria uma manifestação do desagrado com que o povo vê a evolução política em Portugal.

“Esquecem de anotar, porém, que Portugal é um país exportador de mão-de-obra, e que esta condição se manteve e se agravou devido à estrutura econômica arcaica que Salazar [ex-ditador] e seu sucessor Marcelo Caetano fizeram questão de preservar até o fim de seus governos”, escreve o autor. Ele argumenta que a revolução de abril foi acompanhada de dois fatores de “importância capital” para o “comportamento do fluxo migratório do país”: a crise econômica mundial e a descolonização africana.

No primeiro caso, diz, a crise ampliou o desemprego nos países importadores de mão de obra e, consequentemente, teria limitado a entrada dos trabalhadores, caindo em mais de um terço, no que diz respeito aos imigrantes portugueses, apenas entre 1970 e 1974. O segundo aspecto diz respeito à independência dos territórios africanos, “depois de desastradas e custosas campanhas militares”. A descolonização, argumenta, fez retornar a Portugal cerca de 700 mil brancos radicados em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.

Segundo os dados do autor, Portugal “exportara” entre 1965 e 1974 um total de 1,2 milhão de emigrantes, sendo 80% para países europeus. Somando-se com os colonos africanos, diz, “teremos quase 2 milhões de emigrados numa população metropolitana de oito milhões de residentes”. Segundo o Opinião, a política pós-revolução procurava valorizar os portugueses vivendo em Portugal, com a adoção por exemplo da política do salário-mínimo, inexistente no regime salazarista.

O autor argumenta que esta política de distribuição de renda, que prejudicara apenas “setores privilegiados da administração e gerência de negócios”, trouxe consequências benéficas para a “contenção do impulso migratório”, tendo ainda efeitos na “composição dos contingentes chegados aos países acolhedores de mão-de-obra”, entre eles o Brasil. Ele observa que não houve uma “fuga generalizada” que as “carpideiras do antigo regime fizeram aparecer nas manchetes da grande imprensa”.

Estariam ocorrendo ainda, segundo a mesma grande imprensa, a “fuga de quadros de nível superior”, que estariam deixando Portugal “na mais completa e irrecuperável anarquia, por falta de pessoal para gerir e administrar o país”. Afirmando que a realidade “não está à altura do panorama dantesco montado pelos arautos do caos”, o articulista de Opinião argumenta que estes novos imigrantes com nível superior chegados ao Brasil “foram os beneficiários do antigo regime”, e que a sua deserção se deve “menos a motivos ideológicos do que ao inconformismo com a perda dos privilégios”.

Utilizando-se fartamente de tabelas, com dados do DIEESE3 e estatísticas oficiais de emigração dr Portugal, o autor lembra que os “retornados” ou “desalojados” – os cerca de 700 mil portugueses que deixaram as antigas colônias, após os processos de independência – recebem do governo português financiamento e assistência, “operação que custa ao Estado os magros recursos que sobraram depois das guerras coloniais”. Ele afirma também que esta ajuda “retarda a recuperação da economia, abalada pela perda da receita vinda da exploração das colônias, e agravada pela crise econômica mundial”. O excesso de mão de obra entre os “retornados”, diz, acaba se dirigindo para o Brasil – contribuindo, aponta, com metade dos portugueses que chegaram ao país em 1975.

Estes imigrantes sentem “ainda mais” sua nova condição, diz o articulista. “Beneficiários diretos da exploração colonial, e não podendo transferir para fora dos novos países africanos os bens acumulados durante os anos de atividade colonialista, os que chegam ao Brasil não trazem os recursos que acompanham os originados de Portugal, nem possuem, na quase totalidade, as habitações técnicas que lhes permitiriam aspirar aos bons salários que uma minoria vinda da metrópole alcança”, argumenta o artigo no semanário carioca.

A solução seria, como é comum na História do país, uma imigração dirigida, que o autor chama de “perspectiva mais realista” por parte das autoridades de Lisboa, cuja proposta anterior – segundo o texto – seria de 200 mil colonos a serem fixados no Brasil. A “mais realista” se daria na forma de uma “colonização seletiva”, que fixaria em projetos agropecuários e agroindustriais os ex-colonos com experiência de culturas e criação em climas tropicais. Seriam, neste caso, entre 60 e 70 mil “retornados”, segundo a estimativa do autor citando dados não confirmados a partir do censo em Portugal.

A assistência técnica de tais projetos de “imigração seletiva” – que demandariam a existência de infraestrutura para a localização dos imigrantes e escoamento da produção – seria fornecida por duas agências das Nações Unidas – a UNESCO e a FAO –, que já teriam desenvolvido, diz o texto, “projetos similares em outros países”. Haveria, no entanto, um problema caso os projetos de colonização fossem “mistos” – envolvendo brasileiros e portugueses: o “contraste entre o ex-colono, habituado a um padrão de vida relativamente alto, patrocinado pelo trabalho africano, e o modesto trabalhador rural brasileiro, incluído naqueles 50% que constituem a base da pirâmide salarial do País”.

Conclui o autor prevendo que os portugueses continuarão “cumprindo o seu já tradicional caminho: a emigração”. Seja para os países europeus, como nos anos 60, seja para as Américas “de outras décadas”, até que “uma nova perspectiva econômica e social” possa manter em Portugal “todos os que queiram ficar na terra que não é melhor nem pior do que outras” – seu povo está apenas “cumprindo um estágio histórico com atraso, mas que pode recuperar”.

NOTAS

1 Mais em http://hemerotecadigital.bn.br/artigos/opini%C3%A3o

2 Disponível em http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=123307&pagfis=5196&pesq=&url=http://memoria.bn.br/docreader#

3 Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, fundado em 1955 em São Paulo por dirigentes sindicais.

(*) Gustavo Barreto (@gustavobarreto_), 39, é jornalista, com mestrado (2011) e doutorado (2015) em Comunicação e Cultura pela UFRJ. É autor de três livros: o primeiro sobre cidadania, direitos humanos e internet, e os dois demais sobre a história da imigração na imprensa brasileira (todos disponíveis clicando aqui). Atualmente é estudante de Psicologia. Acesse o currículo lattes clicando aqui. Acesse também pelo Facebook (www.facebook.com/gustavo.barreto.rio)

4 pitacos sobre “O que será dos ‘retornados’ portugueses? Artigo no semanário se oposição ‘Opinião’ em 1977

  1. Achei a ideia de pf4r a malta e0 procura exeltcnee, e je1 encontrei Os Lusedadas e…. – julgava que era tanga! – a faltima palavra e9 realmente enveja.Mas a enveja’ que eu interpretei das palavras do Filipe3o ne3o tenho a certeza que seja a mesma que a sua e9 a inveja que o Cristiano Ronaldo tem a Messi. Inveja esta que o tolhe e lhe suga a possibilidade de ser ele o melhor do mundo.O Cristiano Ronaldo tem (quase) tudo para ser o melhor do mundo: uma te9cnica fabulosa, um fedsico poderoso, uma velocidade estonteante e vontade de se aperfeie7oar. Tudo isto (ao mesmo tempo) podia ser admirado quando ele jogava no Manchester, quando o Messi ainda ne3o tinha aparecido e0 baila O mesmo aconteceu a Federer, depois do Nadal ter aparecido mas parece que je1 se recompf4s PS Como vea, o problema e9 outro…

  2. I’m sailing aborad the Navigator of the Seas this April, aborad the Nation of Why Not (Skip the Easter Egg Hunt and do Your First Royal Caribbean Cruise on that Holiday that Falls on the 12th of April)?’

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