O imigrante ideal tem ‘tenra edade’, argumenta o Correio Paulistano em 1887

Por Gustavo Barreto (*)
Correio Paulistano de 19 de fevereiro de 1887

Correio Paulistano de 19 de fevereiro de 1887

O Correio Paulistano de 19 de fevereiro de 18871 destaca a chegada de imigrantes a bordo do navio Bourgogne, de Gênova, por meio de um contrato entre o governo provincial e a Sociedade Promotora de Imigração para São Paulo. Chegaram no total 810 imigrantes nesta leva, sendo metade para Ribeirão Preto e os demais indo — na ordem numérica — para Araras, Itupeva, Jaú, São Paulo capital, Cordeiros, Campinas, Porto Martins, Indaiatuba, Descalvado, São José do Rio Pardo, Casa Branca, Amparo, Serra Negra, Morro Grande e Itu.

O jornal registra ainda que 34 imigrantes com mais de 12 anos não receberam o auxílio dado pelo governo porque não constituíam família. “É sempre bom lembrarem-se os pesados sacrificios a que a provincia de S. Paulo se tem sujeitado para attrahir uma corrente immigratoria mais ou menos constante e fertil em bons resultados”, diz o Correio. A quantia recebida por imigrante, diz o diário, sofre críticas (não informa-se de quem). O jornal dá dois argumentos: a necessidade de saldar despesas feitas com propaganda (por exemplo) e, em segundo lugar, caso haja um real excesso por cada imigrante, “passará esse excesso a saldo dos cofres provinciaes”.

Mesmo assim o Correio Paulistano “confessa” que teria “a maior satisfação em ver reduzido o maximo de auxilio e augmentados a media e o minimo” — neste caso, o jornal se refere às três faixas de auxílio que o governo fornece, dependendo das solicitações. “A diminuição do maximo do auxilio imoportaria grande economia para os cofres provinciaes e o augmento da media grandes vantagens para a immigração propriamente dita”.

Ainda discutindo a política imigratória, o Correio argumenta que o futuro do mundo do trabalho na província não deveria ser marcado pela aceitação de imigrantes adultos, “mas sim o maior numero de adolescentes e menores”.

“Para os primeiros” — completa o diário, se referindo aos adultos — “a adaptação aos nossos usos e costumes, ao nosso clima, ao novo meio, emfim, a que foram transportados, é muito mais vagorosa e incompleta do que para os demais”.

Os adultos, argumenta, em geral procuram “apenas” melhorias de condições de vida na “dura necessidade da expatriação”. Os adolescentes, por outro lado, fazem “desde logo patria do paiz onde nasceram as suas primeiras aspirações, e ellas se identificam com as mais genuinas aspirações nacionaes”. Conclui o jornal que “esta verdade dentro em breve realizada, melhor ainda applicar-se-á aquelles que aqui aportarem em tenra edade”, acrescentando que os “sacrificios do presente só se justificam em face do futuro de prosperidade e bem-estar da provincia”.

Além dos pedidos “estratégicos” do jornal, um outro traço das políticas migratórias da época se evidencia aqui: não há discussão sobre a nacionalidade dos imigrantes, dada sua obviedade — o futuro é branco e europeu.

NOTA

1Disponível em http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=090972_04&pagfis=8693&pesq=&url=http://memoria.bn.br/docreader#

(*) Gustavo Barreto (@gustavobarreto_), 39, é jornalista, com mestrado (2011) e doutorado (2015) em Comunicação e Cultura pela UFRJ. É autor de três livros: o primeiro sobre cidadania, direitos humanos e internet, e os dois demais sobre a história da imigração na imprensa brasileira (todos disponíveis clicando aqui). Atualmente é estudante de Psicologia. Acesse o currículo lattes clicando aqui. Acesse também pelo Facebook (www.facebook.com/gustavo.barreto.rio)

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