Israel, “colhendo alguns frutos dos dias pioneiros”
A edição de 28 de abril de 19631 do Correio da Manhã publica um suplemento especial destacando o 15o aniversário do Estado de Israel, “país em desenvolvimento” que está “colhendo alguns frutos dos dias pioneiros”. Registra o jornal que a “terra é áspera e o caminho tem sido difícil”, mas agora realiza-se o “sonho de 2.000 anos”.
O diário afirma que o povo que atualmente compõe Israel provém de 70 países, um total de cerca de 2,3 milhões de pessoas. “Em parte destros (sic)2 e fortes, em parte ignorantes e outros arrasados e destroçados.
A data é comemorada de acordo com o calendário hebreu e, naquele ano, cairia no dia 29 de abril. Para marcar o Dia da Independência de Israel, diz o diário, “apresentamos aos leitores uma visão em miniatura do esfôrço que se vem realizando ali e que está servindo como exemplo para o mundo”.
Na mesma página, em destaque, dois anúncios publicitários: um da loja de departamentos Mesbla congratulando a “laboriosa Colônia Israelita do Brasil” pela data e outra companhia de cigarros Souza Cruz, que diz que o 15o aniversário do Estado de Israel é a “cristalização de um sonho duramente tornado realidade: uma pátria para o povo judeu”, um “grandioso legado de paz às futuras gerações”. Nas páginas seguintes do encarte, mais de uma dezena de anúncios parabenizando a data.
Na página seguinte um texto de Carlos Heitor Cony sobre a “arte da falar mal dos judeus”, reivindicando o autor ser próximo da colônia, pelos “avós de sangue semita”. Uma outra matéria fala sobre o “culto judaico da atualidade”, enquanto que um outro texto, de autoria do próprio então primeiro-ministro, aborda a importância dos fundadores do Estado de Israel, lembrando o primeiro “Congresso Sionista” na Basileia e as ameaças dos Estados “muçulmanos” que pretendem “destruir Israel”.
Moda, educação, economia, ciência, música, teatro, religião, história, turismo – o complemento de 31 páginas discute Israel do ponto de vista de Israel, sem problematizar a visão judaica em momento algum. Na página 23 do suplemento, uma publicidade anuncia o “semanário judaico independente” (citado em português e hebraico) identificado como “Aonde vamos?”, que se reivindica como “há 21 anos o órgão da elite da coletividade judaica em todo o Brasil”.
NOTAS
1 Disponível em http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=089842_07&pagfis=39256&pesq=&url=http://memoria.bn.br/docreader#
2 No dicionário Michaelis, “destro” faz referência, ainda, tanto àqueles hábeis com a mão direita quanto “astuto, sagaz”.