Entre a peste bubônica e a febre amarela: as precárias condições sanitárias do Brasil do final do século 19

Por Gustavo Barreto (*)
Capa do Correio Paulistano de 5 de dezembro de 1899

Capa do Correio Paulistano de 5 de dezembro de 1899

A situação sanitária não era das melhores nas duas principais cidades portuárias brasileiras, Rio de Janeiro e Santos, por onde entravam a maioria dos imigrantes à época. É o que registra, por exemplo, o Correio Paulistano de 5 de dezembro de 1899, em matéria publicada na primeira página1.

Registra o diário um “conflicto positivo” entre os governos federal e paulista no que diz respeito ao desembarque de imigrantes. O governo do Estado, diz a publicação, quer que os imigrantes desembarquem em Santos, se dirigindo imediatamente para a Hospedaria em São Paulo; já a União diz que a recepção por Santos é inadmissível, dado um quadro epidêmico de peste bubônica que teve início neste ano na cidade2.

A sugestão para a mudança para Santos, registra o diário de tendência pró-governo do Estado citando fontes comunitárias, foi do cônsul da Itália, por conta de uma outra ameaça de saúde pública no Rio: estavam ocorrendo “numerosos casos” de febre amarela entre os imigrantes na Ilha das Flores, a hospedaria carioca.

“Contrariamente á resolução do governo deste Estado, que entendeu conveniente o transporte dos immigrantes directamente de Santos para esta capital, afim de evitar a passagem dos mesmos pela Hospedaria da Ilha das Flores, para o que já havia expedido as necessarias ordens, o sr. dr. Nuno de Andrade foi de opinião que a passagem dos mesmos pelo porto de Santos sujeita-os a maior perigo”, diz uma outra seção, na mesma página, intitulada “Peste bubonica”.

O diário paulistano defende a posição estadual: “Do Rio não se póde sahir sem correr o perigo do contagio amarillico; em Santos é facilimo evitar os perigos da bubonica com o isolamento completo dos desembarcados, graças aos recursos do porto e da estrada Ingleza”. O redator – assina o texto Fabio Vera – reclama da solução encontrada: “Acredito que o governo do Estado perdeu, pela sua pouca habilidade, uma causa por natureza ganha, assim como que o federal, conscio da superioridade dos seus representantes, deu maior relevo ao proprio conceito que no caso vertente não é o mais justo”.

O diário registra que a hospedaria da capital paulistana abrigava, no dia anterior, 1.606 imigrantes. Também na primeira página, em destaque, o jornal registra que ocorreram até o dia anterior à publicação da edição 33 casos de peste bubônica em Santos, citando um mapa organizado pelo diretor do Serviço Sanitário.

NOTAS

1 Edição disponível em http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=090972_05&pagfis=11065&pesq=&url=http://memoria.bn.br/docreader#

2 Uma ampla documentação sobre a epidemia está registrada em uma página da Fiocruz, vide http://bit.ly/1ii4adj

(*) Gustavo Barreto (@gustavobarreto_), 39, é jornalista, com mestrado (2011) e doutorado (2015) em Comunicação e Cultura pela UFRJ. É autor de três livros: o primeiro sobre cidadania, direitos humanos e internet, e os dois demais sobre a história da imigração na imprensa brasileira (todos disponíveis clicando aqui). Atualmente é estudante de Psicologia. Acesse o currículo lattes clicando aqui. Acesse também pelo Facebook (www.facebook.com/gustavo.barreto.rio)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *