‘De preferencia immigrantes allemães’, pede o governo imperial

Por Gustavo Barreto (*)
Jornal O Despertador, de Florianópolis (à época, 'Desterro'): trecho da edição de 13 de janeiro de 1871

Jornal O Despertador, de Florianópolis (à época, ‘Desterro’): trecho da edição de 13 de janeiro de 1871

O jornal bissemanal O Despertador, de Florianópolis1, publica na edição de 13 de janeiro de 18712 um contrato entre o governo imperial e uma empresa (Mackai Filho & Ca.) para a introdução e estabelecimento de imigrantes europeus no Brasil. Anualmente, diz o contrato datado de 17 de dezembro do ano anterior, deverão ser “importados” pela empresa até 5 mil imigrantes europeus, podendo esse número ser ampliado mediante acordo prévio, e “escolhidos entre agricultores e trabalhadores ruraes bem morigerados, em condições de perfeita saude e nunca maiores de 45 annos”. O número não poderá ser inferior a 2 mil e, caso falhe em cumprir o contrato, a empresa deverá pagar “5$000 por individuo que faltar para preencher este numero”.

Além de serem europeus, o artigo sétimo do contrato determina que os “emprezarios obrigão-se a importar de preferencia immigrantes allemães, de cuja nacionalidade deve constar, pelo menos, metade dos que por elles forem introduzidos annualmente no Imperio”. Na chegada, os seguintes dados de cada imigrante devem constar oficialmente: nome, naturalidade, idade, profissão, estado e religião. Caso a empresa cumpra as diversas condições do edital, o governo se compromete ainda a pagar parte da passagem – para os imigrantes ela é gratuita –, com a primeira metade do subsídio já paga em Londres. Os subsídios também incluem gastos com propaganda.

O edital determina ainda que as empresas são obrigadas a estabelecer no Rio de Janeiro e em outros portos do Brasil, “onde fôr necessario”, agências para o “recebimento, agasalho, sustento e estabelecimento dos immigrantes que importarem”.

Outro tipo de ajuda curiosa é a obrigatoriedade de se implementar escolas públicas e, aparentemente, a instrução religiosa. Diz o artigo 17: “Obriga-se o governo a dotar de escolas publicas os estabelecimentos da empreza na proporção de uma escola para 50 meninos, de cada sexo, menores de 10 annos, assim como de pastores ou capellães na proporção de um para 200 famílias ou mil individuos”.

Essa obrigatoriedade contrastava com a reduzidíssima taxa de escolas públicas que os próprios brasileiros possuíam. Um relatório aponta, por exemplo, que em 1867 apenas 10% da população em idade escolar se matriculara nas escolas elementares, enquanto que até 1879 era formalmente proibido que os escravos se matriculassem em uma instituição de ensino – uma legislação que veio posteriormente a cair novamente.3

NOTAS

1 À época, a cidade se chamava Desterro, mudando seu nome para o atual em 1894.

2 Disponível em http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=709581&pagfis=3194&pesq=&url=http://memoria.bn.br/docreader#

3 ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação e da Pedagogia. 3ª Ed. São Paulo: Editora Moderna Ltda, 2009, pg. 222.

(*) Gustavo Barreto (@gustavobarreto_), 39, é jornalista, com mestrado (2011) e doutorado (2015) em Comunicação e Cultura pela UFRJ. É autor de três livros: o primeiro sobre cidadania, direitos humanos e internet, e os dois demais sobre a história da imigração na imprensa brasileira (todos disponíveis clicando aqui). Atualmente é estudante de Psicologia. Acesse o currículo lattes clicando aqui. Acesse também pelo Facebook (www.facebook.com/gustavo.barreto.rio)

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