A super-tele brasileira é mexicana

Por Gustavo Barreto (*)

Depois de oito anos de governos tucanos e mais dez de governos petistas, as telecomunicações brasileiras são um fracasso total. Os serviços são de qualidade duvidosa, caros e não estão disponíveis para todos os brasileiros. Além disso, o setor é controlado por empresas estrangeiras.

Por Gustavo Gindre

Charge do Blog do Kayser.

Charge do Blog do Kayser.

Quando o governo de Fernando Henrique Cardoso tomou a decisão de privatizar o Sistema Telebrás, um grupo de representantes dos trabalhadores em telecomunicações enviou ao governo uma proposta de como fazer essa privatização. Em primeiro lugar, seriam extintas as “teles” estaduais (como Telerj, Telesp, etc), que estavam aparelhados por grupos políticos regionais.

As tais empresas estaduais seriam reunidas numa única empresa nacional e somente então seu capital seria vendido, com a condição de que seus controladores fossem empresários brasileiros. E a União manteria uma golden share que lhe permitiria intervir na empresa caso houvesse, por exemplo, risco de alienação do controle para grupos estrangeiros.

Depois disso, o mercado seria aberto para a entrada de operadoras estrangeiras que, contudo, teriam que se confrontar com um forte “campeão nacional”. Em linhas gerais, foi esse o percurso adotado pela Europa e o México.

Mas, o governo FHC optou por trilhar um caminho radicalmente diferente, fracionando o Sistema Telebrás e vendendo as partes para consórcios em geral liderados por empresas estrangeiras. Com isso, as telecomunicações brasileiras hoje são dominadas por empresas espanhola (Vivo/Telefônica), mexicana (Embratel/Claro/NET), italiana (TIM), francesa (GVT) e norte-americanas (Sky e Nextel).

Oi

A Oi é fruto da compra da Brasil Telecom pela Telemar e opera em 26 estados (exceto São Paulo). Para que a compra pudesse ocorrer, o governo Lula teve que alterar o Plano Geral de Outorgas (PGO) que não permitia o surgimento de uma empresa tão grande. A justificativa implícita era retomar, ao menos em parte, aquela proposta de termos um “campeão nacional” que pudesse enfrentar as empresas estrangeiras citadas acima. Contudo, o resultado parece ter sido bem diferente. BNDES e Previ diminuíram suas participações na Oi, permitindo que a Portugal Telecom (um sócio estrangeiro, portanto) se tornasse a maior acionista da empresa, com cerca de 27% de seu capital.

Tampouco a Oi ousou se internacionalizar, como o governo alegou na época. Ao contrário, a empresa vendeu seu único ativo fora do Brasil: uma rede de cerca de 22 mil km. de cabos submarinos que ligam o Brasil aos Estados Unidos. Mas, o pior mesmo é que a empresa se endividou (cerca de R$ 33 bilhões) e seu valor de mercado (R$ 8 bilhões) é uma fração da Vivo/Telefônica (R$ 52 bilhões) e da TIM (R$ 20 bilhões), as outras duas empresas de telecomunicações que também vendem ações em bolsa. Para piorar, a Oi tem uma infra-estrutura extensa e ultrapassada, que requer fortíssimos investimentos.

America Movil

Enquanto o Brasil optou por fracionar e vender para o capital estrangeiro a Telebrás, o México fez o caminho inverso, mantendo unificada e vendendo  a Telmex para um empresário mexicano (Carlos Slim Helu). Atualmente a empresa opera telefonia fixa, celular, banda larga e TV paga em todos os países hispânicos da América Latina e Caribe (exceto Venezuela, Bolívia e Cuba) e no Brasil (Embratel/Claro/NET), além de ser dona de uma “operadora virtual” de telefonia celular nos Estados Unidos.

Na prática, a empresa divide o controle das telecomunicações latino-americanas com a Telefonica de España (que atua com as marcas Vivo, no Brasil, e Movistar, nos demais países). Aproveitando-se da crise européia, a América Movil comprou 22% da Austria Telekom e se prepara para assumir 100% da holandesa KPN. Ao final da transação na Holanda, a America Movil deve herdar cerca de 17% da maior operadora de celular da Alemanha, curiosamente controlada por sua rival Telefonica de España.

Fracasso

Depois de oito anos de governos tucanos e mais dez de governos petistas, as telecomunicações brasileiras são um fracasso total. Os serviços são de qualidade duvidosa, caros e não estão disponíveis para todos os brasileiros. Além disso, o setor é controlado por empresas estrangeiras. Em geral, essas empresas são de países que atravessam dificuldades financeiras (Portugal, Espanha e Itália) ou elas próprias precisam vender ativos para reduzir dívidas e/ou terem recursos para investir (casos da GVT e Nextel). Há, portanto, uma enorme pressão para que elas minimizem investimentos e maximizem o envio de dividendos para seus controladores estrangeiros.

Como se não bastasse, o projeto de criar uma “super-tele” brasileira revelou-se um retumbante fracasso. A Oi não consegue investir o que deveria, vende ativos, se endivida e perde valor de mercado. Nesse processo, a “super-tele” brasileira (sic) é mexicana, já que Carlos Slim Helu controla, em terras tupiniquins, a Embratel, a Claro, a NET e a operadora de satélites Star One. E conseguiu explorar não apenas o mercado latino-americano como começa a estender seus tentáculos para o “velho mundo”.

E ninguém, absolutamente ninguém, é responsabilizado por esses 18 anos de fracasso. Sem contar que não parece haver a menor vontade do governo em patrocinar uma correção de rumos.

[Texto originalmente publicado em http://bit.ly/17wnhgi]

(*) Gustavo Barreto (@gustavobarreto_), 39, é jornalista, com mestrado (2011) e doutorado (2015) em Comunicação e Cultura pela UFRJ. É autor de três livros: o primeiro sobre cidadania, direitos humanos e internet, e os dois demais sobre a história da imigração na imprensa brasileira (todos disponíveis clicando aqui). Atualmente é estudante de Psicologia. Acesse o currículo lattes clicando aqui. Acesse também pelo Facebook (www.facebook.com/gustavo.barreto.rio)

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